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Educando eletronicamente

Renato M.E. Sabbatini

Recentemente, o Professor Paulo Renato, titular do Ministério de Educação, anunciou o plano do governo para colocar microcomputadores nas mais de 200 mil escolas públicas brasileiras. A idéia, no futuro, é transformar esses computadores em portas de acesso para a rede mundial de computadores, a Internet. Dessa maneira, professores (principalmente) e alunos poderão utilizar o vastíssimo repositório de informação nessa rede, que atualmente tem mais de 50 milhões de documentos multimídia, residentes em aproximadamente 300 mil computadores. Um serviço de pesquisa e acesso, como o Digital Altavista, ou o Excite, permitem localizar em segundos onde está qualquer tipo de informação desejada, por mais detalhada que seja, e recuperá-la para visualização na tela do microcomputador, impressão, etc.

O custo dessa empreitada, embora alto pelos padrões de um país em desenvolvimento, irá se pagar em pouco tempo, pelo retorno social que trará. A relação custo-benefício é incomparável. Imagine o leitor, por exemplo, se o governo resolvesse doar uma Encyclopaedia Britannica, considerada a melhor enciclopédia do mundo (44 milhões de palavras, 65 mil verbetes, 12 mil ilustrações), para cada escola. Ela sairia pelo preço aproximado de um microcomputador. No entanto, essa, e outras milhares de publicações, entre as quais cerca o texto completo de mais de 10 mil livros, cerca de 6 mil revistas e jornais, etc., estão disponíveis a custo zero através da Internet. Assim, colocar um computador ligado à Internet, em uma escola, equivale a doar uma biblioteca “virtual” gigantesca, espalhada pelo mundo, a um custo pouco inferior a 3 mil reais, mais uma taxa mensal de acesso, muito baixa. Mas não é só isso. A característica de interatividade da Internet, através do correio eletrônico, dos “bate-papos on-line” (“chats”), etc., permitirá que os professores e alunos brasileiros entrem em contato e conversem com colegas de todo o mundo, ampliando enormemente os horizontes mentais e destruindo as imensas barreiras geográficas impostas pelo tamanho de nosso território nacional. Palavras como globalização, internacionalização, etc., o domínio de novos idiomas, alavancado pelo interesse irrefreável do adolescente em se socializar e fazer amigos, receberão novos sentidos, conceitos e realidades.

A entrada de dezenas de milhares de novos computadores na Internet brasileira, também dará um impulso enorme ao desenvolvimento dessa rede. Atualmente, o Brasil tem cerca de 300 mil usuários, o que eqüivale a meros 0,18 % da população. Na Austrália, por exemplo, são 600 mil usuários, mas que representam 2,5 % da população. Temos muito que progredir, e o projeto do Ministério da Educação deve ser saudado com o maior entusiasmo possível. Finalmente estamos tendo visões de futuro na educação brasileira, e deixando o ramerrão cotidiano da merenda e do giz, sem nunca nos preocuparmos com a qualidade e a democratização do ensino.

Evidentemente, será necessário conhecer em mais detalhes o plano do governo para saber se ele vai dar certo. Colocar computadores nas escolas, por si só, não adianta nada. Inúmeros projetos anteriores, de vários países, de equipar escolas com equipamento sofisticados, sem garantir treinamento e continuidade de uso, falharam miseravelmente, levando a um enorme desperdício de verbas públicas. Basta ver o nível alarmante de depredação, roubo e vandalismo nas escolas públicas brasileiras. Computadores, videocassetes e antenas parabólicas desaparecerão em um piscar de olhos. Diretores, apertados de verbas para pagar funcionários ou manter a escola aberta, não hesitarão em vender os equipamentos, se não houver controles. Para acessar a Internet, são necessários linha telefônica, dinheiro para pagar o acesso, e provedores confiáveis a uma distância razoável. E assim por diante.

Esperamos ardentemente que o Ministério esteja bem assessorado para contemplar todos essas complexidades. E que o projeto tenha sucesso.


Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 26/9/96.
Autor: Email: sabbatin@nib.unicamp.br
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