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Satélites na rede

Renato Sabbatini


Como todo mundo sabe, está ocorrendo uma briga feia entre duas tecnologias na área de emissão de TV, que são os satélites e os cabos óticos. Os interesses econômicos são altíssimos, e a entrada recente de uma tecnologia digital de alta qualidade via satélite, a DirecTV, alterou bastante a direção que o mercado estava tomando. As antenas são pequenas e baratas, o sinal pode ser recebido em qualquer lugar, o sistema praticamente nunca sai do ar, e a oferta de canais é muito mais alta do que pela TV a cabo (uma nova empresa formada pelo magnata das comunicações, Rupert Murdoch, pretende oferecer 500 canais !). No entanto, a assinatura mensal ainda é cara, e a qualidade da imagem não é exatamente igual a da transmissão por cabo.

A tecnologia de acesso à Internet também será afetada pelo resultado dessa briga, evidentemente. Um dos problemas dos satélites atuais, que os cabos óticos não têm, é o tamanho fixo dos canais de comunicação (o que os técnicos chamam de "banda"). Por exemplo, se o pico de tráfego entre a Internet brasileira e a dos EUA alcança 200 megabits por segundo às 8 da noite, o ideal seria que os canais de satélite contratados entre os dois países tivessem cerca de 80 % dessa capacidade. Entretanto, haveria um desperdício grande de canais nas horas de menor movimento, sendo que o preço é cobrado pela capacidade máxima. Tecnologias modernas de comunicação digital por cabo, como a ATM, permitem reprogramar por software a capacidade dos canais entre dois pontos quaisquer, e isso os satélites atuais ainda não tem.

A empresa americana Hughes, que produziu 42 % de todos os satélites de comunicação em funcionamento no mundo, anunciou recentemente duas novas gerações de satélites, uma chamada SpaceWay, e outra chamada DemandNet, que prometem acirrar a briga a que me referi. O sistema SpaceWay consta de oito satélites em órbita geossincrônica, usando a banda Ka, com transmissores e receptores de altíssima potência, e que permitirão o uso de antenas do tamanho da DirecTV (24 polegadas), de forma interativa (as anteninhas também permitirão a emissão de volta ao satélite, o que é impossível atualmente, e que cria a possibilidade de interação, necessária para a Internet por satélite direto). A capacidade também é alta: mais de 1 milhão de ligações ao mesmo tempo, e velocidades de transmissão de até 6 megabits por segundo.

Já a DemandNet é ainda mais revolucionária para a futura Internet, pois ela possibilitará o compartilhamento dinâmico de canais. Será uma rede global de satélites de tecnologia VSAT, com os canais digitais de comunicação programáveis pelo usuário, ou seja, no horário de pico de um país (que é diferente de outro), a capacidade dos canais poderá ser aumentada automaticamente, tornando o sistema todo extremamente flexível. Redes virtuais globais poderão ser implementadas facilmente com a DemandNet, e poderão ser expandidas facilmente, em questão de dias, à medida que a demanda aumentar. Por exemplo, poderia haver uma rede dedicada à telemedicina entre todos os países do Mercosul ou da América Latina, para a transmissão de radiografias, exames de ultra-som, etc. entre hospitais e médicos.

À medida em que um número maior de satélites e de canais de satélites se torna disponível (fala-se em cerca de 500 novos satélites de comunicação nos próximos anos !), o preço cairá bastante, viabilizando muitas coisas que hoje são proibitivas economicamente. A própria Hughes prevê que um terminal da DemandNet (incluindo antena, decodificado, e software) custará menos de 1.000 dólares no lançamento, e no futuro poderá custar menos de 200 dólares. Num futuro não muito remoto, podemos imaginar que todos os microcomputadores serão vendidos já com uma placa decodificadora interna e uma miniantena parabólica.

Por outro lado, caso as fibras óticas ganhem a briga, o cenário poderá ser bastante diferente. Nos EUA, cerca de 60 % das residências de classe média recebem TV a cabo. A maioria das empresas nessa área já têm projetos de ligação à Internet, com velocidades bem superiores às de satélite, e muitas vezes superior à dos modems telefônicos. É apenas uma questão de tempo que isso aconteça (e de regulamentação pelo governo), mas uma desvantagem forte é o custo muito mais alto de instalação de infraestrutura.
 

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Renato M.E. Sabbatini é professor e diretor associado do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas, colunista de ciência do Correio Popular, e colunista de informática do Caderno Cosmo. Email: sabbatin@nib.unicamp.br

Veja também: Índice de todos os artigos anteriores de Informática do Dr. Sabbatini no Correio Popular.



Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 18/3/1997 .
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