Possivelmente a atividade mais complexa do cérebro (e única entre todos os animais) é a de um músico que interpreta uma partitura. Ele, ao mesmo tempo, tem que ler e decodificar a complexa seqüência de símbolos musicais de uma partitura, recorrer à sua memória para saber como acionar o teclado e o pedal do piano, e conseguir o resultado apropriado em termos de tonalidade, duração, etc. O sistema motor do cérebro aciona os dedos e o braço, e o sistema auditivo monitora o resultado, informando aos demais centros se alguma coisa está errada. Fico atônito de admiração quando ouço concertistas tocarem uma sonada de Rachmaninoff inteiramente de memória: são centenas de milhares de detalhes que tem que ser relembrados perfeitamente, sem erro, na seqüência exata, em poucos minutos. É um show de desempenho do nosso maravilhoso computador cerebral.
A informática, ou seja, os computadores artificiais, tem ajudado muito os cientistas a entender como funciona o nosso "computador natural". Por exemplo, foram desenvolvidos equipamentos, como a tomografia de ressonância magnética funcional (fMRI) e a tomografia PET (Positron Emission Tomography), que permitem tirar "retratos instantâneos" da atividade do cérebro em várias situações, usando complexos programas de computador. As imagens aparecem em várias cores, como em um arco-íris. Regiões do cérebro pintados pelo computador na tela com tonalidade vermelha, amarela e branca, estão mostrando alta atividade funcional.
Nos últimos cinco anos foram publicados vários trabalhos
científicos, notadamente pelos pesquisadores Peter Fox e Juliane
Sergent, mostrando como se dá a atividade cerebral quando um músico
está executando uma música. Foi possível identificar
claramente como se dá a ativação do cérebro
quando um músico lê, interpreta e toca uma música registrada
em uma partitura. Ambos pesquisadores demonstraram que cada fase da execução
musical ocorre em uma parte diferente do cérebro, e que existe uma
espécie de "rede neural distribuida" que se encarrega de propagar
os dados de um centro cerebral para outro. Fica assim demonstrado o conceito
de que o nosso cérebro não é um computador, mas sim
uma confedereação de computadores cooperantes, ou uma "sociedade
da mente", como o denominou o pesquisador do MIT, Prof. Marvin Minsky.
É um exemplo fantástico de pesquisa interdisciplinar em ciência,
e de como a informática está sendo fundamental nos novos
estudos sobre o cérebro e o comportamento. Se tiver interesse, visite
http://www.bic.mni.mcgill.ca/
e http://imr.utsa.edu/petpiano.htm.
Para ler uma entrevista que realizei com o Prof. Minsky sobre estes e outros
temas, veja a revista on-line "Cérebro & Mente" da UNICAMP (http://www.epub.org.br/cm),
em seu último número.
Sabbatini, RME - Tomografia
PET: Uma Janela para o Cérebro. Revista Cérebro &
Mente 1(1), 1997.
Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 06/10/98.
Autor: Email: sabbatin@nib.unicamp.br