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Filantropia pela Web

 

Renato Sabbatini


O setor filantrópico conta agora com uma nova e poderosa arma para arrecadar auxílios e doações do público em geral: a Internet, e mais especificamente a Web. Estão se multiplicando velozmente as iniciativas de captação de recursos, como o StopHunger, que fez sucesso recentemente no Brasil, bem como campanhas de doações a vítimas de catástrofes naturais e guerras, como as inundações na Venezuela e na América Central, e a guerra de Kosovo. Organizações internacionais de socorro, como a Cruz Vermelha, Médicos Sem Fronteiras, etc., notam um aumento considerável nas doações após esses acontecimentos, mesmo que não sejam divulgadas amplamente. Eu mesmo fiz uma doação para as vítimas de Kosovo através do site da Cruz Vermelha Internacional (www.redcross.org) e achei a experiência muito interessante e fácil de realizar (usando um cartão de crédito).

Os países desenvolvidos (EUA e Europa, principalmente) têm um sistema filantrópico importante, que hoje representa cerca de 8% do GNP, com bens avaliados em cerca de 2 trilhões de dólares (1,3 trilhão apenas nos EUA, onde um entre cada 10 pessoas trabalha para uma fundação ou entidade sem fins lucrativos. Um em cada dois americanos doa dinheiro regularmente ou presta serviços comunitários, doando seu tempo a tais organizações).

A lista de empresas de alta tecnologia que doam muito dinheiro a causas filantrópicas é grande. A Intel (www.intel.com) e a Hewlett-Packard (www.hp.com), no Vale do Silício, são as que mais doam: 48 milhões e 33 milhões de dólares por ano, respectivamente. Aliás, é naquela região, o berço da maioria das empresas de informática nos EUA, com a Apple (www.apple.com), a Sun (www.sun.com) e outras, que um consórcio de empresas sustenta um interessante empreendimento educacional chamado "The Tech Museum of Innovation", na cidade de San Jose. A Microsoft é outra grande doadora, embora seja sediada em Seattle, no estado de Washington.As empresas de telecomunicação também figuram de maneira relevante: AT&T, Bell Atlantic, GTE, US West e Bell South são as maiores. Algumas empresas doam uma parcela substancial de seu faturamento bruto, entre 4 a 6%.

As empresas que lidam diretamente com o público geral são as que mais doan, porque elas querem ser consideradas como boas "empresas cidadãs", que contribuem parte do imenso dinheiro que ganham para o bem comum, para a sociedade menos privilegiada. Entre as "ponto.com's", destacam-se algumas, como a famosa eBay (www.ebay.com), a maior empresa de leilões on-line do mundo, que tem 9 milhões de usuários. Ela realiza leilões diariamente em favor de entidades filantrópicas, tendo ajudado dezenas delas. Também estabelecu a eBay Foundation, que recebeu vários milhões de dólares de doações, que investe em projetos educacionais e sociais.

A Web tem permitido às ponto.com realizar projetos interessantes de beneficiência social. Quem entrar no site da Encyclopaedia Britannica (www.britannica.com) é convidade à doar dinheiro para sua entidade de preferência, que todas as providências são realizadas pela EB. No site Fool (www.fool.com), cerca de 140 mil dólares são arrecadados por mês dessa maneira, e ainda a empresa dá 10 mil dólares adicionais para a entidade que arrecadar mais dinheiro. Mas não é só: quem colocar uma mensagem nos fóruns automaticamente está doando 2 centavos para entidades de caridade. O site de comércio eletrônico da empresa (FoolMart) também doa 1% de todo seu rendimento.

Porque tanta generosidade? Obviamente é por que existe, em primeiro lugar, uma consciência social maior. Todos nós vivemos juntos nesse mundo, e temos que contribuir para que ele seja um lugar melhor. Para algumas das empresas, o mercado tem sido tão bom, que elas se sentem compelidas por essa consciência, a retribuir diretamente à sociedade um pouco do que ganharam, ao invés de simplesmente pagaram seus impostos em dia. Por outro lado, é óbvio que existe um certo interesse próprio. As fundações e as doações conferem um lustro à imagem pública da empresa, e o dinheiro doado pode ser deduzido do Imposto de Renda.

O maior doador do mundo é hoje Bill Gates, tão difamado por certos setores do mundo da Informática. A Fundação Bill e Melinda Gates, tem um patrimônio de mais de 17 bilhões de dólares (isso mesmo, bilhões) para doar para projetos de educação, tecnologia aplicada à area social e saúde. Na maior doação individual da história, o casal deu quase um bilhão de dólares para um programa de erradicação de doenças infantis, como o pólio, nos países pobres, através de vacinação. Um programa de construção de bibliotecas escolares nos EUA já recebeu mais de 50 milhões de dólares. Bill Gates já declarou que pretende doar 90% de sua fortuna pessoal, estimada em 100 bilhões de dólares, ainda em vida. Esse, sim, é um exemplo que muitos milionários brasileiros deveriam seguir!

As empresas iniciantes da Internet poderiam doar mais, pois seus presidentes são muito jovens e (ainda) idealistas. O problema é que, pela lógica dos investimentos nessas empresas, a maioria não gera lucros (o gigante Amazon dá prejuízo desde que foi fundado, há cinco anos), e portanto não há o que doar. Mas alguns net-milionários estão doando ações da empresa, que (e se) se valorizarem, representarão somas consideráveis. A Fundação eBay recebeu 225.000 ações, por exemplo.

Essas doações são realmente efetivas? Nos EUA, parece que sim, mas mesmo assim as empresas doadoras encomendaram recentemente um estudo a uma entidade especializada. Elas deseja, assegurar que as doações sejam efetivas, e uma das sugestões dadas pelo estudo é que as doações sejam condicionadas ao treinamento e suporte a quem as recebe (principamente quando for hardware e software), de modo que eles saibam usá-los quando chegarem.
 



Renato M.E. Sabbatini é professor e diretor associado do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas, colunista de ciência do Correio Popular, e colunista de informática do Caderno Cosmo. Email: sabbatin@nib.unicamp.br

Veja também: Índice de todos os artigos anteriores de Informática do Dr. Sabbatini no Correio Popular.



Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 18/2/2000 .
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